terça-feira, 25 de março de 2014

No aconchego de um sonho ruim



                                                                           
     Só sei que corri, corri de um inferno que jamais poderei escapar. Sendo a mente humana a maior câmara de tortura do mundo, como imaginei que uma simples bala de chumbo poderia me livrar dela?
       Quando me disseram, ainda criança, que Deus condena os suicidas, eu desconsiderei. Hoje, tantos anos depois, eu percebo como fui tosca.
       Abri os olhos e tentei me levantar, apenas para me deparar com a dura verdade de que não poderia, jamais, me mover novamente. Senti o ar quente, denso e pesado, entrar nos meus pulmões, a escuridão envolveu meus olhos e aos poucos o acostumou com a falta de luz. Conforme o ar ia chegando ao fim e a sensação de claustrofobia ia aumentando, percebi que, talvez, estivesse no real inferno.
      Movi meus lábios e gritei, ocupei cada espaço vazio com o som da minha voz e, mesmo que raros, os vácuos do tumulo ecoaram com meu desespero. Eu chorava sem lágrimas. Não poderia morrer novamente, pois já me encontrava toda morta, presa numa caixa de concreto e na minha própria cabeça e corpo.
      Não havia lugar para cometer suicídio, não havia canto para meus ouvidos e para meus braços debaterem. Não tinha nenhum ponto que eu pudesse bater minha cabeça e abrir meu crânio mais uma vez, não, eu não podia sequer me mexer, quem diria... Tentando morrer novamente?      Só sei que conforme minha consciência ia diminuindo eu orei, orei para todos os santos que lembrava. Orei para Deus e para o mundo. Orei até para o demônio. Quando, enfim, desmaiei. Acordei.
     Levantei de repente na minha cama, olhei ao redor e, então, me senti mais viva que nunca. Enquanto eu me lembrava de que estava na minha casa e não enterrada, recordava também que a vida valia a pena, pois se aquilo era uma breve demonstração do inferno, nenhum sofrimento terreno chegaria aos pés.
       Só sei que foi no aconchego de um sonho ruim, nos braços do meu pior pesadelo, que pude mais uma vez contemplar o valor da vida.






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